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Seca verde é identificada no litoral do Piauí e afeta agricultores familiares

Reflexo das mudanças climáticas, a condição climática atinge os municípios de Luís Correia e Cajueiro da Praia.

Por: Viviana Braga 01 abr 2025, 13:50

Em plena temporada de chuvas no Piauí, uma condição climática tem afetado pequenos produtores rurais do litoral do estado: a seca verde. O fenômeno, que consiste em chuvas mal distribuídas em tempo e espaço, foi recentemente identificado na região por meio de um levantamento feito pela Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Piauí (Semarh) e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), e é reflexo das mudanças climáticas.

Os municípios de Luís Correia e Cajueiro da Praia estão entre as áreas mais atingidas pela condição, comprometendo a produção de pequenos produtores rurais. Segundo os órgãos responsáveis, apesar da paisagem verde, o estudo apontou que a quantidade de chuva não tem sido suficiente para gerar boa colheita e também afeta a criação de animais.

“O principal fator para esse fenômeno está ocorrendo é a irregularidade das chuvas. É importante que a população entenda que uma chuva de 100 milímetros, em um único dia, não vai dar fim a uma seca que perdura há mais de seis meses. As chuvas regulares tanto temporalmente quanto espacialmente são importantes para que as pequenas produções se desenvolvam”, explica Sara Cardoso, coordenadora da Sala de Monitoramento e Previsão de Eventos Climáticos Extremos.

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Ainda de acordo com a climatologista, a descoberta da seca verde na faixa litorânea surpreendeu até mesmo as equipes de monitoramento. “Percorremos quase 2 mil km em quatro rotas realizando a manutenção dos pluviômetros convencionais. E para nossa surpresa, encontramos essa condição na faixa litorânea. Sem dúvida, essa realidade já é um efeito das mudanças climáticas e, em conversa com técnicos de outros estados, foi observado que já acontece em praticamente todo o Nordeste, com exceção de uma parcela do Ceará e Rio Grande do Norte”, esclarece.

No Povoado Camurupim, zona rural de Luís Correia, agricultores familiares vivem essa realidade. Em uma região com grande potencial para produção de feijão, milho e mandioca, a irregularidade das chuvas gera grande preocupação, conforme relata Liduína De Almeida, vice-presidente do  Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Luís Correia. A entidade representa cerca de três mil pequenos produtores da região.

“Aqui temos casos de agricultores que plantaram em dezembro e que, infelizmente, perderam a plantação por conta da escassez de chuva, que esse ano começou mais tarde. Outros, que esperaram o Dia de São José para plantar – seguindo a tradição religiosa, agora se agarram na fé de que a frequência de chuva melhore daqui pra frente”, diz.

Agricultores debatem alternativas de enfrentamento a seca verde /Foto: Viviana Braga

Em entrevista à Mídia EcoNós, o agricultor familiar José Ivan de Sousa relatou como tem percebido essas mudanças e os impactos negativos na produção. “Aqui era uma fartura de água nessa época. A produção rendia e era garantido o sustento. Agora, chove em um local e, às vezes, em outro aqui do lado, não cai uma gota de água Para se ter uma ideia, o rio Camurupim já era pra tá cheio. Pode olhar lá, a gente só vê mais areia”, diz.

Além do baixo nível no rio Camurupim, a seca verde também pode ser observada em outros importantes mananciais da região, como a Lagoa da Mutuca, Lagoa do Jabuti e Lagoa do Sobradinho. 

Leito do Rio Camurupim quase seco no trecho que passa pelo Povoado/Foto: Viviana Braga

Diante da instabilidade de chuvas, que não é suficiente para as plantações e nem para abastecer os reservatórios de água, a esperança dos agricultores familiares do litoral do Piauí é contar com o apoio de políticas públicas, como o Garantia Safra, ou parcerias feitas com instituições financeiras.

“Aqui até pra furar um poço é difícil. Em muitos pontos nem chega a dar água ou só sai água salgada. Diante de tudo isso, muitas vezes a única alternativa é buscar apoio financeiro. Hoje mesmo já tivemos reunião com o Banco Nordeste para ver o que pode ser feito”, completa Liduína de Almeida.

Ainda dentro das estratégias de enfrentamento à seca verde, a climatologista Sara Cardoso reforça que a manutenção dos pluviômetros e a capacitação de técnicos observadores locais são ações fundamentais para a coleta precisa de dados para o Monitor de Secas do Piauí.  “A precisão dessas informações é crucial para o planejamento estratégico e a implementação de políticas públicas eficazes no combate à seca e no apoio ao setor agrícola”.

Mas enquanto análises técnicas e tratativas para crédito financeiro ainda são feitas, o tempo e as mudanças climáticas correm contra aqueles que, muitas vezes, só têm na água e na produtividade da terra seu único meio de sobrevivência. “Esse ano tá devagar demais, não vai dá muita coisa não”, lamenta José Ivan.

Viviana Braga

Jornalista, cofundadora e diretora-executiva da EcoNós.

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